É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo." (Clarice Lispector)

sábado, 26 de março de 2011

Carencia

Os dias passavam,  e como é natural do ser humano eu fui me rendendo aquela nova vida.
Se tinha que ser assim, então eu tentaria domar meu coração.
Não choraria mais todas as noites, não sofreria tanto a saudade que me matava, saudade de minha mãe de meus irmãos da minha liberdade moleca.calar meu coração era o que faria...
Acho que desde muito nova eu o aprisionei, e junto com ele minhas vontades, meus desejos e meus sonhos;
Decidi que viveria como eles queriam e que seria agradecida por não estar na rua esmolando;
Se não podiam ou não tinham amor pra me dar, me bastavam as migalhas de um sorriso amarelo, ou o beijo frio 
quando eu tirava notas boas.
Os poucos elogios me enchiam de vaidade.
E eu procurava fazer tudo certo, tamanha minha carencia de afeto,.Eu queria ganhar uma migalhinha de afeto.O que já me deixava profundamente feliz.
Não invejava meus irmãos , eu apenas desejava ter mais amor, ter um pouco do amor dispensado a eles.
Nunca posso reclamar de coisas materiais, pois isso sempre me deram de sobra.Sempre ficava com o quarto que fosse suite, estudei piano, jazz e tambem me colocaram em escolas particulares.
Mas tudo isso não bastava, eu sempre sentia que era menor, menos importante e quando minha mãe se referia a mim, como a sua criada eu achava que era porque eu era filha de criação.
Não sabia que criada era empregada, e que ela dizia assim justamente porque se eu perguntasse ela poderia explicar de outra forma.
Eu sempre me lembrava do aniversario dela, os filhos se esqueciam, meu pai tambem, mas eu jamais me esqueci. E olha que esqueço até do meu. Pedia ao meu pai que comprasse flores, presentes e graças a mim ela sempre teve seu aniversário lembrado.
Mas eu sentia que eu a incomodava.
Sempre me punia por coisas tão pequenas, certa vez tirei nota vermelha, ela me deixou seis meses sem ver tv, eu amava televisão, Foi horrivel.
E assim alguns castigos vieram...Palavras ouvidas nas noites ditas por ela como:"É isso que dá criar filho dos outros."
Meu pai sempre me deu mais carinho, um pouquinho mais, mas ela quando via ele me abraçar logo me afastava dele o que foi piorando a medida que o tempo foi passando e eu fui tomando corpo de mulher.
Com apenas onze anos já era uma mulher, corpo definido, cintura bem delineada e modéstia a parte um belo corpo que a natureza me deu tão cedo.Um presente ou uma maldição?
Esse corpo bonito , esse corpo de mulher tão precocemente formado me fez sofrer demais.
Os assédios, os ataques, as tentativas de abuso iriam começar...


Sandra